Tentando aproximar a Ásia da América do Sul e vice-versa

Ponto de Inflexão no Japão

18 de abril de 2011
Por: Paulo Yokota | Seção: Economia, Política | Tags: , , | 8 Comentários »

Todos concordam que o desastre natural do último dia 11 de março no Japão deve provocar significativas mudanças naquele país, assuntos que estão sendo estudados por importantes analistas políticos. A revista Foreign Affairs é considerada das mais prestigiosas no mundo no campo da geopolítica, e um artigo de Michael J. Green, com o título “Tokyo’s Turning Point” (Ponto de inflexão de Tóquio), expressa alguns pontos de vista que devem ser considerados. O primeiro que já vem sendo expresso por este site reconhece a fragilidade humana diante da força da natureza, mesmo num país considerado dos mais preparados para os desastres naturais.

O artigo reconhece a população japonesa é relativamente idosa, que foi mais vitimada, e a política japonesa está instável com seis primeiros-ministros nos últimos cinco anos, que o Japão depende da energia nuclear não contando com outras fontes e o débito publico japonês é elevado. Mas o desastre revelou o vigor da economia japonesa e o caráter nacional como o seu estoicismo, levando muitos a reconhecerem que o país reconstruído voltará a dar a sua contribuição internacional, fortalecendo algumas de suas relações externas, como a aliança com os Estados Unidos.

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Takeaki Matsumoto e Hilary Clinton

O artigo do Foreign Affairs entende que o Sistema de Defesa Interna do Japão, bem como as forças militares norte-americanas, conseguiu uma mudança de relacionamento com o público japonês, participando ativamente do socorro das vítimas utilizando maciçamente dos seus recursos humanos e materiais. Os Estados Unidos mobilizaram 20.000 soldados, cerca de 160 aviões e 20 navios, na operação chamada Tomodati, que significa amigos. A matéria entende que haverá um fortalecimento desta aliança militar, pela qual os Estados Unidos vêm cuidando da segurança externa japonesa, para o bem como alguns inconvenientes. Desta tendência participa também a Coreia do Sul (em função das ameaças da Coreia do Norte), e em menor grau a Rússia, tendo a China expressada pouco apoio, apesar de ter enviado uma missão de socorro.

Estes interesses foram expressos pela secretária de Estado Hillary Clinton que, além da negociação com a sua contrapartida, foi recebida tanto pelo primeiro-ministro como pelo Imperador e a Imperatriz, como noticiado pelo jornal japonês Nikkei. Existem perspectivas para o fortalecimento da aliança bilateral entre os dois países, importante para ambos e para a segurança asiática.

No campo político, ficou constatado que o Japão precisará mudar depois da queda do Partido Liberal Democrata, e mesmo com o Partido Democrático do Japão no poder, os dois partidos não foram capazes de se renovar, dando espaço para os novos líderes. Nos momentos de crise naquele país, os jovens têm assumido as iniciativas, como nos trabalhos voluntários que estão se proliferando atualmente. A única iniciativa política que foi destacada é a intenção japonesa de intensificação da integração internacional no “Trans-Pacific Partnership” (Parceria Trans-Pacífica) que também é integrada pelos Estados Unidos.

Hillary Clinton e o ministro Takeaki Matsumoto concordaram em estabelecer uma nova iniciativa público-privada envolvendo governos, círculos econômicos privados, instituições de pesquisas do tipo “think tanks” bem como organizações não governamentais para a reconstrução japonesa. Líderes empresariais de ambos os países também estão se manifestando no mesmo sentido, segundo o Nikkei. Tudo isto pode representar um novo ponto de inflexão nas recentes tendências japonesas.


8 Comentários para “Ponto de Inflexão no Japão”

  1. Massa
    1  escreveu às 17:09 em 18 de abril de 2011:

    Caro Paulo,

    Obrigado pela rápida resposta !

    Acredito como você na força que os japoneses possuem, mas a grande questão é, será que eles são tão otimistas como nós?

    Infelizmente, pelas informações que temos, não digo apenas dos jornais, mas dados estatísticos, análises economicas e previsões de vários especialistas, não será fácil superar essa crise, pois olhando de uma perspectiva mais longa, antes do terremoto, o Japão já enfrentava uma queda na sua capacidade de inovação e desenvolvimento, logo o desastre só venho a piorar a situação, não é?

    De qualquer forma, o Japão já enfrentava um período de transição onde o setor de serviços ganhava mais importância, situação que não é tão ruim assim, a grande questão é como fazer essa passagem de forma suave, sem impacto na sociedade, talvez com essa crise a mudança aconteça mais rápido e o país supere essa fase.

    Enfim, acredito que a crise japonesa não é material, mas espiritual, pois o Japão não possui riquezas naturais, o único tesouro são os próprios japoneses, mas infelizmente eles estão preferindo deixar de ter filhos em troca de "mais dinheiro", isto é, estabilidade na conta bancária.

    O desastre em Tohoku demosntra como pode ser insignificante os bens materiais, as pessoas choravam não pela perda das casas, mas pelos entes queridos que morreram…

  2. Paulo Yokota
    2  escreveu às 20:52 em 18 de abril de 2011:

    Caro Massa,
    Morei e trabalhei no Japão, onde mantenho muitos amigos. Visito regularmente o país, e procuro me manter informado. Como postei num artigo do site, a indústria japonesa cresceu no exterior, de onde importam a custo FOB porto por cerca de 10% do preço final para os consumidores. Como fazem todas, por exemplo, as confecções do tipo Uniqlo (o mesmo que faz NYDK, Banana Republic e todas as outras demais do setor). 90% são serviços e as intermediações do lojista final.
    Nada é facil em economia, mas os japoneses estão mostrando com a velocidade da reconstrução que acreditam no futuro. Se não, para que reconstruir? Apesar de ser cristão e ter uma posição ecumenista, não utilizo argumentos como “espiritual”, pois se assim fosse os japoneses por serem na maioria shintoista e budistas, acabam sendo mais tolerantes, favorecendo o desenvolvimento. A queda de natalidade é um fenomeno universal, principalmente nos países desenvolvidos.
    O choque que sofreram está provocando uma reação positiva dos japoneses, como houve em outros desastres naturais ou depois da derrota na Segunda Guerra Mundial.
    Aprenda com os japoneses pois eles possuem muitas qualidades, pois concluo que V. mora no Japão. Sempre temos coisas para aprender no exterior. Pode demorar um pouco, mas acredito que o Japão vai voltar a ter um desenvolvimento mais acentuado, enfrentando o desafio a que estão submetidos.
    Acompanho o noticiário e os estudos mais profundos feitos no exterior, e na sua maioria, acreditam que os japoneses voltarão mais vigorosos. E se os japoneses não acreditassem nisso, não estariam reconstruindo suas empresas. Algumas desaparecerão, mas novas serão construidas, num processo geral de renovação.

    Paulo Yokota

  3. Massa
    3  escreveu às 18:22 em 18 de abril de 2011:

    Ponto de inflexão para melhor ou pior para o Japão ? Eis a questão !
    É difícil de responder, mas alguns indícios existem:
    1.O p.ministro Kan continua impopular, claramente ninguém está satisfeito com a falta de resultados em Fukushima;
    2.Até agora os estrategistas japoneses não lançaram nenhum plano de longo prazo para a recuperação do Japão, apenas medidas de curto e médio alcance;
    3.Infelizmente o Japão está perdendo uma oportunidade de invocar o nacionalismo japonês em pró da união nacional, uma grande chance para tomar ações drásticas que tirem o Japão do impasse em vários setores, como reforma educacional, previdenciario, etc.
    4.Claramente o impacto do acidente nuclear será negativo para o setor energético do Japão , o custo de manutenção e construção ficará bem mais caro.
    5.A industria japonese está sendo fortemente afetado, numa época de forte concorrência coreana e chinesa, poderá ser fatal para algumas empresas.

  4. Paulo Yokota
    4  escreveu às 18:43 em 18 de abril de 2011:

    Caro Massa,

    Qualquer fenômeno pode ser visto do prisma negativo ou positivo. Os analistas experimentados, na sua grande maioria, entendem que já está havendo uma aglutinação nacional pela reconstrução no Japão. Evidentemente, o segmento mais fraco nesta mudança está na área política, mas o exame de situações similares, tanto no Japão como no exterior, demonstram que mesmo sem uma liderança forte e de um estadista, existem possibilidades de forte recuperação, com ajuda externa, como depois da Segunda Guerra Mundial, crise do petróleo, terremoto de Kobe etc. Os jovens, que estavam acomodados, estão se envolvendo nos trabalhos voluntários, quase a totalidade da infraestrutura foi recuperada, as empresas japonesas, na sua maioria, voltaram a operar plenamente. Os seres humanos são dotados da possibilidade de reação diante de desafios. No Japão o trabalho coletivo sempre foi mais importante que lideranças individuais.
    Quanto há um desastre natural há uma forte tendência para que a reconstrução seja feita com inovações. Uma fábrica nova costuma ser mais eficiente que uma velha e desgastada.
    Que eu saiba, na história da humanidade, pouco se fez com pessimismo, como no malthusianismo. O desenvolvimento é feito por iniciativas como as schumpiterianas. Quanto mais acirrada a concorrência com outros asiáticos há necessidade de maior competitividade.
    Até um rato, quando encurralado no canto de uma sala por um gato, vira leão.
    Não sei o que o levou ao pessimismo, mas esteja certo que será mais feliz com um pouco de otimismo. A humanidade veio melhorando ao longo da história superando as limitações, e no desenvolvimento, quando superamos um obstáculo surgem outros três para serem também vencidos. Pode acreditar um pouco mais nos homens e nos japoneses. Eles chegaram ao nível de renda atual, num arquipélago sem recursos naturais, sujeitos a muitos desastres naturais. São lutadores, são vencedores, tanto que estavam um pouco acomodados pelo elevado nível de renda, e agora estão diante de um desafio da reconstrução.

    Paulo Yokota

  5. Everaldo Diniz
    5  escreveu às 20:00 em 18 de abril de 2011:

    Excelente a análise do economista Yokota.

  6. Paulo Yokota
    6  escreveu às 20:03 em 18 de abril de 2011:

    Caro Everaldo Diniz,

    Obrigado pelo comentário. O site é um espaço democrático e opiniões diferentes também são publicados.

    Paulo Yokota

  7. Paulo Ramos
    7  escreveu às 14:38 em 19 de abril de 2011:

    O conhecimento do Dr. Yokota sobre o Japão é impressionante! Cada dia aprendo mais com o senhor.

  8. Paulo Yokota
    8  escreveu às 12:46 em 19 de abril de 2011:

    Caro Paulo Ramos,

    Obrigado pelo comentário. Conheço algumas coisas sobre o Japão, mas como tanto na Ásia como na América do Sul nossos conhecimentos recíprocos são baixos, espero estar estimulando o aumento dos mesmo.

    Paulo Yokota


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