Tentando aproximar a Ásia da América do Sul e vice-versa

Entrevista de Luis Stuhlberger para o Valor Econômico

7 de fevereiro de 2013
Por: Paulo Yokota | Seção: Economia, Editoriais, Notícias, webtown | Tags: , ,

Muitos são os que consideram Luis Stuhlberger um dos melhores profissionais do mercado de capitais do Brasil, ele que se consagrou na Hedging Griffo e permaneceu na instituição quando passou a ser comandada pela Credit Suisse. A longa entrevista concedida para Luciana Seabra e Catherine Vieira, do jornal Valor Econômico, é esclarecedora sobre o atual estado de espírito deste mercado, onde a família do Fundo Verde, criado em 1997, continua atualmente com um patrimônio líquido de R$ 17,8 bilhões, segundo o jornal. Este resumo deve ser encarado como mero aperitivo.

A entrevista está dividida em duas partes, com muitas informações substanciosas. Na primeira que leva o título de “Sem ação”, dividida em 14 tópicos, além de uma introdução. Na segunda, “Globalização do gestor local será o fenômeno de 2013”, com 12 tópicos, tudo ocupando quase uma página e meia de um jornal como Valor Econômico, o que denota a grande importância dada à matéria.

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Luis Stuhlberger. Foto: Marcelo Ximenes/AE

Apesar da tentativa das entrevistadoras de enquadrá-lo como pessimista, acho que o adequado é classificá-lo como realista, mostrando-se profundo conhecedor tanto do mercado de capitais no Brasil como em termos internacionais. Reflete o atual estado de espírito dos operadores deste mercado, onde muitos procuram seguir os seus passos, ainda que sem a sua base de justificativas, que são fundamentadas.

Ele está com apenas 16% dos recursos dos Fundos Verdes aplicados em ações brasileiras, quando a sua média histórica é de 33%. Interpreta que os preços atuais estão altos, mesmo com a Bolsa mantendo-se por um longo período ao nível de 60 mil pontos.

Apesar de muitos interpretarem que os dirigentes no exterior visualizam oportunidades no Brasil, mesmo partilhando desta opinião, não se sente seguro para maiores aplicações, inclusive em outros ativos financeiros locais. Em 2012, a bolsa foi o mercado que mais alegrias proporcionou ao Fundo Verde, rendendo 19,55%, quando o Ibovespa subiu 7,4% e o CDI 8,4%.

Ele acha exagerado o sentimento de que o mundo vai se acabar, que domina muitos operadores, diante da situação caótica em que se encontra o mercado mundial, mesmo com a Europa dando sinais que volta para a austeridade. Ele acha que os problemas brasileiros se devem aos brasileiros, não adiantando culpar nenhum dos estrangeiros, no tópico que denominaram Crise Global.

No Rotação para o risco, ele informa que o mundo está num processo de mudança dos investimentos dos bonds para ações, inclusive com fluxos para os mercados emergentes. Isto ele interpreta como um ambiente benéfico, mas sem que seja para sempre.

No “Alguém tem que ceder”, interpreta que há uma “boca de jacaré”, ou seja, uma demanda que não é atendida pela oferta, diante da falta de confiança, represando um grande volume de recursos que continuam líquidos, sem serem investidos na produção. Tudo influi no câmbio, na inflação e nas finanças públicas, resultando numa visão pessimista, mas que não está para acontecer imediatamente.

No “Modelo insustentável”, ele vê o varejo crescendo sem que o investimento se realize, mais no Brasil que em outros países como o México e a Coreia, que se comporta de forma mais amena. Num determinado momento, ele aguarda uma recuperação dos investimentos.

“No Investimento”, ele vê o governo mantendo o consumo e tentando estimular os investimentos, como o uso do BNDES, mas constata a falta de confiança do setor privado por muitas razões. A falta de investimentos não aumenta a produtividade, acabando por comprimir a sua margem, sem redução dos impostos e dos salários.

No tópico “Confiança”, ele acha que a Dilma procura fazer um bom trabalho com os empresários, mas a volta da confiança é um processo demorado, enquanto o país vai perdendo competitividade com relação aos seus concorrentes, sendo que muitas condições ela já herdou.

No “Ceticismo”, apesar de um bom ambiente, com fluxo dos recursos do exterior, ainda ele se sente cético, pois os preços locais estão elevados. No tópico “Ações caras”, ele acha que os riscos das empresas brasileiras são altos dando, como exemplo, o que aconteceu no setor elétrico, nas estatais mal geridas, no petróleo demandando tempo, nas construtoras demorando em entregar, nos retornos dos bancos menores, tudo com o Ibovespa estagnado.

No “Preço e fundamento”, ele se considera pessimista, mas dependendo do preço ele compra. Os valores atuais estão quatro vezes mais elevados de quando comprou, na educação, no varejo, no consumo. No “All time low”, ele informa que está comprando no exterior.

No “NTN-Bs longas”, ele admite que a relação dívida/PIB continua baixa, mas os estímulos fiscais às estatais deixou a necessidade de aportes de recursos na Caixa e no BNDES, uma situação que vai se tornando insustentável e preocupante, ainda que não seja imediato.

No “Zero de bolsa”, ele interpreta que os mercados acabam voltando aos fundamentos, e sem a sua melhora acaba reduzindo suas aplicações nas ações locais. No “Sem blue chips e photoshop”, ele informa que não tem mais blue chips, e está olhando o Brasil, sem ficar convencido. No “Esperando pra ver”, ele informa que continua na posição angustiante de continuar vendo…

No “Impopular na escola”, ele sempre ia contra a corrente, e espera estar errado, para o bem do Brasil. Com isto, termina o primeiro artigo que deveria ser muito bem examinado pelas autoridades.

No segundo artigo, Luis Stuhlberger informou às entrevistadoras que os investidores estão órfãos, procurando novos pais. No item “Cucaracho Asset Management” interpreta que os gestores vão para a globalização este ano. No “Mundo construtivo”, ele interpreta que sendo um pouco pessimista está defendendo o patrimônio dos investidores, se estiver certo.

Ele informa em “Encontro com Soros” que esteve longamente com ele, que estava com muitos relatórios dos Fundos Verdes grifados, enquanto parlamentares italianos e espanhóis não se decidiam pela austeridade. Em “Choque de realidade”, ele informa que o The Economist tinha afirmado que o Brasil decolaria, e ele era a única opinião contrária. Ele acha que os investidores estrangeiros vêm ao Brasil com mais realismo.

No “Três vias”, ele acha que a diversificação vai para ações, securitização e real states. Algo iria para a infraestrutura. No “Prejuízo isento”, ele informa que muito vai para os fundos imobiliários, e ele prefere lucros tributados aos prejuízos isentos.

Em “Bolsa e governo”, ele acha que o prejuízo da intervenção do governo já está no preço. No “Micro e macro”, ele interpreta que o Brasil não está em condições de passar de uma renda per capita de US$ 10 mil para US$ 15 mil, e mesmo empresas maravilhosas só podem ter sucesso em cenários positivos de longo prazo.

No “Agenda Jorge Ben Jor”, ele usa a figura “Se malandro soubesse como é bom ser honesto seria honesto só por malandragem”, referindo-se a passagem do velho mercado para o novo. No “Sobra no CDI”, ele informa que ainda restam R$ 4 trilhões, num processo que ainda está no começo. No “Renda Fixa”, ele interpreta que comprar NTN-B com vencimento para janeiro de 2016 ao IPCA mais 2,70% é um bom negócio, pois nos Estados Unidos só se consegue IPCA menos 1%, enquanto no Brasil o juro doméstico está a uns 3% ao ano.

E finalmente, no “Alerta”, ele afirma que com juros baixos, as pessoas tendem a comprar qualquer coisa, o que parece uma decisão incorreta. E ele conclui que o ser humano, do mesmo jeito que não é racional nas compras, também não o é nos investimentos.

As jornalistas que dividiram as diversas perguntas neste itens todos, parecem ter conseguido uma forma inteligente de apresentação das principais ideias de Luis Stuhlberger. Todas as autoridades econômicas do país deveriam prestar muita atenção em toda esta entrevista, na sua integra que está no Valor Econômico de hoje, e os que operam no mercado, certamente o estão fazendo. Ainda que o assunto não seja de minha especialidade.



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