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Algumas Consequências das Recentes Decisões Jurídicas

9 de abril de 2018
Por: Paulo Yokota | Seção: Editoriais e Notícias, Política | Tags: , ,

A prevalecer algumas tendências decorrentes de decisões judiciais recentemente tomadas no Brasil até nas instâncias mais elevadas do Judiciário, com o objetivo de procurar coibir as irregularidades que estão generalizadas, deixa-se consequências sobre as quais nem sempre se tem chamado a atenção da opinião pública.

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STF na sessão que rejeitou o habeas corpus de Luis Ignácio Lula da Silva

Todos sabiam que não se decidia somente sobre o HC para Lula da Silva no STF, mas estavam em definição, mesmo temporariamente, muitos aspectos envolvidos que teriam consequências mais amplas em milhares de outros casos. No fundo, as decisões envolviam com base em diversos indícios que o apartamento triplex de Guarujá era de propriedade de Lula da Silva sendo parte das vantagens que ele teria recebido, ainda que o acusado alegasse que não havia prova cabal sobre o assunto.

Até agora, o ato claro para a transferência da propriedade era a existência do registro no registro civil nos imóveis urbanos como um documento que fosse temporariamente válido como a promessa de compra e venda ou a transferência efetiva da propriedade. Quando dos imóveis rurais seriam as condições que atendiam as exigências estabelecidas pelo INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária para a transferência da propriedade.

A decisão do juiz Sérgio Moro tomada em Curitiba, homologada em segunda instância pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região em Porto Alegre, estabelecia que houvesse um crime de corrupção, pois o apartamento tríplex em Guarujá era de Lula da Silva. Aceitou-se que depoimentos de muitos interrogados eram indícios suficientes de prova para atribuir a propriedade ao ex-presidente da República.

Na qualidade de ex-presidente do INCRA, fico com a impressão que haverá necessidade de uma legislação adicional para esclarecer esta situação, pois existem milhares de imóveis rurais que são alegados como legítimos de seus proprietários, quando ainda são grilagens ou baseados em documentos precários que não devem reconhecer a propriedade como legítima. Também existem muitos bancos que aceitam garantias hipotecárias somente com registros feitos em cartórios de imóveis, para não deixar dúvidas sobre a legitimidade destes ativos e seus proprietários.

De outro lado, a questão de uma jurisprudência alegada sobre o disposto na Constituição de 1988 que é muito detalhada, quando ela é explícita em assegurar que os indiciados só podem ser considerados culpados quando esgotados nos recursos possíveis. Difere com a dos Estados Unidos, que têm uma Constituição sintética somente de princípios que vão sendo modificados nas suas interpretações da Suprema Corte daquele país. Como não existe ainda um consenso sobre o assunto, está havendo uma nova solicitação para que a matéria seja discutida no STF, o que vem sendo recusada pela presidente Carmen Lúcia. A imprensa informa que o ministro Marco Aurélio Mello insistirá na definição deste aspecto na próxima semana, ele que é relator de uma questão sobre o assunto e recebeu solicitação adicional de um partido político para tanto.

Existem os que interpretam que Lula da Silva poderia não ser o proprietário do apartamento tríplex de Guarujá, mas usufruiria das vantagens do seu uso. Até agora existem indícios que estes assuntos ligados ao ex-presidente bem como as matérias a ele ligadas apresentam duas correntes distintas entre os atuais membros do STF, tanto que na última votação para a concessão ou não do HC, a presidente do Supremo teve dar o seu voto de minerva, mostrando a existência de um grupo expressivo de ministros que possuem posições divergentes. Sou daqueles que entendem que o melhor esclarecimento destas matérias, caso haja maioria dos membros do Supremo, devia ser uma mudança constitucional para que não fique um conflito da atual jurisprudência com o texto explícito da Constituição. As dificuldades para tanto são evidentes, pois haveria necessidade de 2/3 dos membros do Congresso Nacional para tanto, o que é difícil de ser obtido. Jurisprudência do Supremo chocando com um texto explícito da Constituição soa como algo anormal, podendo gerar sempre conflitos, ainda que a tendência seja de consolidação da posição que já provocou a prisão de Lula da Silva.

O combate à corrupção sempre gerará conflitos em qualquer sociedade, parecendo indispensável que as medidas tomadas pelas autoridades sejam claras, tomando-se todos os cuidados para que sejam mais cautelosamente possíveis. As Constituições foram introduzidas como instrumentos adequados da defesa dos cidadãos aos eventuais abusos das autoridades, mesmo que não haja unanimidades sobre elas. Sem estas orientações, todos ficarão inseguros, pois eventuais ocupantes de cargos importantes poderão prejudicar os direitos legítimos dos cidadãos que estejam inscritos nas Cartas Magnas, com interpretações que nunca sejam definitivas.

Em muitos países, admite-se que as Constituições estabeleçam aspirações gerais que nem sempre podem ser todas atendidas, dadas às limitações dos recursos disponíveis, inclusive de auxiliares das autoridades. Deve-se admitir que também estivéssemos lidando com uma coletividade formada por seres humanos que não são perfeitos, devendo haver mecanismos para a correção de eventuais erros.

O que seria desejável é que houvesse um mínimo de consenso para que não se enfrente permanentemente uma contestação, inclusive violenta e ilegal, por parte dos que entendem que estão sendo prejudicados. A forma democrática de decisão seria a eleição, mas no atual quadro de extrema divisão política não parece que mesmo o vencedor eleitoral tenha o suporte de uma expressiva maioria, mesmo num segundo turno.

A exagerada polarização que parece prevalecer atualmente não só no Brasil não é muito tranquilizadora, mas a esperança é sempre que, mesmo por absoluta necessidade, haja uma razoável aglutinação de variadas forças política em torno de alguns mais expressivos, ficando claro quem seja a situação e a sua oposição.



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