Tentando aproximar a Ásia da América do Sul e vice-versa

O Sabor do “Wagashi” na Cultura Nipo-Brasileira

15 de setembro de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Depoimentos | Tags: , , , , , , , | 1 Comentário »

O Projeto Saberes dos Sabores, da Fundação Japão-SP, nos trouxe recentemente a chef pâtissier Cristina Makibuchi falando sobre wagashi – confeitaria japonesa, na qual se aperfeiçoou em Fukui, Japão – e sobre yôgashi – confeitaria ocidental, cuja técnica aprimorou nas escolas Lenôtre e Le Cordon Bleu, em Paris. E Paulo Yokota tece também saborosos comentários sobre doces japoneses, aqui no site (02/09/2010). Como poderia a nossa memória olfato-palatal-visual não despertar em busca do doce sabor nunca perdido da nossa infância?

A particularidade do doce japonês é a sua doçura suave, que não agride o paladar nem os dentes. Cristina Makibuchi teve que reeducar seu paladar para o sabor doce, quando voltou do Japão, e começou a confeccionar doces e bolos ocidentais em São Paulo. Clientes reclamavam por seus doces não serem suficientemente doces. Ela redirecionou a “doçura”, mas seus produtos continuam bastante “sugar luz”.

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“Guenji Monogatari”, por Akihiko Niimi

9 de setembro de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Livros e Filmes | Tags: , , ,

Genji Monogatari – Contos de Genji, escrito por volta do ano 1000, é considerado o romance mais antigo do mundo. Conta os amores do belo e sedutor príncipe Hikaru Genji e, depois da sua morte, a busca afetiva de outro príncipe, Kaoru, que Genji pensava ser seu filho. São 54 capítulos com profusão de personagens que fascinam e intrigam. Códigos de ética e estética se norteiam por preceitos como mono-no-aware, mujôkan – que falam da apreciação patética da fugacidade e da ilusão efêmera das coisas, como beleza ou prazeres físicos da vida. O escritor Yasunari Kawabata o considerava “o ápice da literatura japonesa”.

Devido à dificuldade de sua compreensão, escrito em linguagem da corte de séculos atrás, fizeram-se adaptações, edições comentadas, e mesmo traduções completas para o japonês moderno, como a feita pelo escritor Jun-ichiro Tanizaki (1941). Há inúmeras traduções e adaptações nas mais diversas línguas. A história tem sido muito ilustrada por diferentes meios, e São Paulo acaba de ter a rica oportunidade de conferir, através de palestra, ilustrada com projeção de pinturas, desenhos e mangás, do professor Akihiko Niimi, de Literatura Clássica da Notre Dame Seishin University, da província de Okayama. Com ênfase na obra de Murasaki Shikibu, e doutor em Literatura pela Universidade de Waseda, o professor Niimi está no Brasil a convite da Universidade de São Paulo e sob os auspícios da Fundação Japão-SP.

Ilustração do cap. 20, atribuída a Tosa Mitsuoki (1617-1691)

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Still Life with Rice, de Helie Lee

3 de setembro de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Livros e Filmes | Tags: , , , , ,

A autora, Helie Lee, nascida na Coreia do Sul, emigrou para o Canadá ainda criança com os pais e a irmã, em 1968. Dali, a família passou para a Costa Oeste americana, onde hoje reside, em LaCrescenta, Califórnia. Seus pais desejavam para suas filhas um futuro com liberdade e sem ameaça de guerras, onde pudessem manter a identidade cultural. Helie Lee cresceu odiando sua origem asiática, renegando a herança coreana, e tudo fazia para parecer uma garota ocidental. Mas na sua casa se falava coreano, e ela indiscutivelmente não conseguia passar sem a sua tigela de arroz com kimuchi (conserva típica de legumes com molho picante de pimenta vermelha). Uma atração irrefreável a leva a uma viagem em busca de suas raízes, já adulta, à Coreia do Sul e a Xangai, na China.

Neste livro, Helie Lee relata a provação vivida pelo povo coreano desde a ocupação japonesa até os recentes anos da Coreia dividida em Norte e Sul, e em permanente estado de guerra fria depois de ter suportado uma devastadora guerra civil. Narrada pela voz da sua avó materna, Hongyong Baek, nascida em Pyongyang em 1912, é, ao mesmo tempo, uma dura e incisiva revelação do sofrimento das mulheres e crianças coreanas – pois guerras e invasões, embora seja um jogo de homens, fazem de mulheres e crianças as maiores vítimas.

Capa Still Life With Rice - Helie Lee

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Lori Matsukawa, a Voz Nikkey de Seattle, Washington

23 de agosto de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Depoimentos | Tags: , , , | 2 Comentários »

Lori Matsukawa Por iniciativa do escritório da Fundação Japão de Nova Iorque, a jornalista nipo-americana Lori Matsukawa está visitando o Brasil, ministrando palestras em várias cidades. Falando sobre o tema “O papel da mídia no convívio multicultural”, Ms. Matsukawa aborda o racismo, direitos civis e a questão da identidade da comunidade asiática na América do Norte. Na cidade de São Paulo, a palestra, seguida de debate, teve mediação do professor Sedi Hirano (pró-reitor de Cultura, USP), e participação dos professores Adriana C. de Oliveira (Univ. Federal do ABC) e Eugênio Bucci (ECA / IEA, USP) e do jornalista Jorge J. Okubaro (editorial, jornal “O Estado de S.Paulo”).

Ms. Matsukawa falou brevemente do histórico dos primeiros imigrantes japoneses nos Estados Unidos, de seus pais em Havaí e depois em Seattle. As conversações sobre a imigração começaram em 1860, e a primeira leva de imigrantes aportou em 1880, 18 anos antes da imigração japonesa para o Brasil. A integração dos japoneses dentro da sociedade americana foi profundamente afetada pela II Guerra. Além do mais, segundo a jornalista, a própria cultura americana impelia a um forte grau de racismo, pois exclusão e discriminação por motivos raciais eram fatos perfeitamente legais. Imigrantes não podiam registrar bens imóveis em seus nomes nem obter, até 1952, nacionalidade americana.

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“Confucius” de Yasushi Inoue

19 de agosto de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Livros e Filmes | Tags: , , , | 5 Comentários »

Confúcio ensinando, retratado por Wu Daozi, Dinastia Tang Na China dos anos 771-221 a.C., aproximadamente 170 estados familiares nobres reinavam fora do controle central. Cada estado tinha a sua capital murada; formavam alianças e ligas entre si, e também travavam acirrados combates militar-diplomáticos, tentando dominar um ao outro. Na era dos Estados Guerreiros, sete reinos dominavam a Planície Central ao Norte do país, entre os Rios Amarelo, Huai e seus volumosos afluentes.

Paradoxalmente, essa época de guerras também suscitou o aparecimento de pensadores que propunham bases teóricas para cultivar uma sociedade humana em harmonia com a ordem do Universo à qual pertenciam. Os reinos, cansados de guerras e destruições, ansiavam por ordem e paz. Pensadores tentavam inspirar reis a procurar viver em harmonia sob o domínio de um único rei, como contava a lenda de uma época dourada quando a China era unificada.

Confúcio (551-479 a.C.) e seus discípulos faziam parte de um grupo de pensadores precursores desse tempo. Foram contemporâneos de grandes mestres da Índia (Buda, circa 560-480 a.C.) e da Grécia (Platão, 420-340 a.C. e Aristóteles 380-320 a.C.), entre outros. Época que historiadores denominam “idade axial” – quando se estabeleceram as primeiras formas básicas do pensamento da civilização no mundo.

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O Leste Asiático e o Império de Kublai Khan, Segundo Yasushi Inoue

11 de agosto de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Livros e Filmes | Tags: , , ,

yasushi_inoue Exímio em narrativas fascinantes sobre angústias urbanas modernas com delicados toques de psicologia amorosa, Yasushi Inoue se sobressai também como talentoso contador de histórias de antigas lendas e tradições da China, Coreia e Japão. Dedicando-se seriamente ao estudo da história chinesa e coreana, fez frequentes viagens aos dois países. Seus inúmeros romances históricos são considerados de profunda autenticidade, não só por intelectuais japoneses como por chineses e coreanos: Os telhados de cerâmica de Tempyô(1957), Tun-huang (1959), Lou-lan (1959), O Lobo Azul (1960- sobre Genghis Khan), Viagens além de Samarkand (1971), Confucius (1989), para citar apenas alguns.

Wind and Waves, University of Hawaii Press-1989, tradução de Fûtô, 1963, conta os dramáticos eventos que afetaram o Leste Asiático – particularmente a península coreana – nos meados do século XIII. Após ter invadido a China, derrotado a Dinastia Sung, e estabelecido o poderoso Império Mongol na China (Dinastia Yuan), Kublai Khan dirigiu sua ambição para a conquista do arquipélago japonês. O Japão, então sob o xogunato de Kamakura, era um país de belicosos samurais, isolado nas brumas além do Mar do Norte. Para Kublai Khan, lá se escondiam imensas riquezas. Emissários enviados para que Kamakura se rendesse ao Imperador Mongol foram seguidamente ignorados pelo xogunato.

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“O Fuzil de Caça”, de Yasushi Inoue

6 de agosto de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Livros e Filmes | Tags: , , | 2 Comentários »

Fuzil de caça_db_220310_final.indd Importante empresário “que habita a área de Osaka e Kobe”, sentindo-se retratado em poema publicado numa revista especializada, escreve para o autor desse poema, intrigado com a precisão com que o poeta o descreveu não só fisicamente, mas até parecendo adivinhar o seu estado de espírito quando vagueava “pela relva coberta de neve de uma reserva de caça em vilarejo de fontes termais, em Izu”. Omite o verdadeiro nome, mas remete também três cartas que lhe foram escritas por três mulheres: uma jovem que descobre o mundo pérfido dos adultos, uma mulher atormentada por fantasmas carregados de rancores e remorsos, e outra que se dissimula por trás de uma máscara de frivolidades e cinismo.

A partir da construção dessas três cartas, o escritor nos faz mergulhar numa bem urdida trama de amor e ódio velado, de traição e vingança recalcada, de solidão e violência reprimida. Num ambiente refinado e sofisticado, cercado por belas paisagens imersas em diferentes estações do ano, que se revelam sutis, luminosas, melancólicas ou hostis, conforme o estado de alma das três mulheres.

A língua japonesa possui uma nuance peculiar, intraduzível em outras línguas: uma linguagem diferenciada para cada sexo, cada idade, cada classe social. Uma mulher adulta fala a língua de mulher adulta, distinta da de uma criança, uma jovem, um rapaz, ou um homem. O estilo epistolar de uma mulher refinada é de elegância delicada e elaborada, permeado de referencias metafóricas a objetos, paisagens ou às condições do tempo que a rodeiam. Que, em verso ou prosa, indicam as mil emoções e antagonismos que vão pela sua alma. O autor manipula essa particularidade com requintada mestria nas epístolas concebidas para as três personagens femininas, três mulheres cultas de idades, personalidades e idiossincrasias diversas. Cuja essência o tradutor conseguiu captar com bastante propriedade.

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Um Professor de Geografia, Cearense de Sobral

30 de julho de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Depoimentos | Tags: | 2 Comentários »

Dissertações elucidativas e didáticas do economista Paulo Yokota sobre regiões norte-nordeste do Brasil que vêm sendo publicadas neste site, resgatam remotas aulas de Geografia, de gratas lembranças.

Adamantina, cidade a oeste do estado de São Paulo, anos 50, contava no nível ginasial – além de dois colégios particulares – com um ginásio estadual, cujo exame de admissão era bastante rigoroso. Atraía estudantes até de cidades vizinhas pela fama do excelente corpo docente e pela qualidade do ensino. Uma grande porcentagem de seus alunos era filhos de imigrantes japoneses.

Entre professores que marcaram nossa adolescência, destacava-se um advogado e sociólogo de ilustre estirpe de políticos cearenses, de quem nunca soubemos como fora parar naqueles confins paulistas. Olhos perscrutadores, sério e sisudo, o professor José Euclides Ferreira Gomes Júnior intimidava à primeira vista. Mas atrás daquele olhar penetrante se escondia um homem afável, reservado, um poço de cultura e muito carisma. A política era o seu assunto predileto. Seria eleito vereador na cidade, e foi combativo líder da câmara adamantinense.

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Professor José Euclides Ferreira Gomes Júnior. Assinando o livro de posse como prefeito de Sobral

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O Grão: Ciclo de Vida e Morte Segundo Petrus Cariry

28 de julho de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Livros e Filmes | Tags: , | 2 Comentários »

Por se tratar de cineasta ainda desconhecido no sul, assistir a este filme foi uma surpresa bastante agradável, numa estreia sem alardes em São Paulo. É a história de pequena e humilde família em vilarejo não muito distante de Fortaleza, contada com simplicidade e em lento ritmo de espera. Como se a vida fosse um longo e silencioso tempo de espera para a morte.

Esse tempo age de forma distinta para cada personagem. Há um senso de resignação dos adultos diante de um novo tempo, ou diante da iminência da morte: na avó adoentada que prepara o neto para a separação que ela pressente, na filha e no genro presos numa vida de desesperança e imobilidade. Para jovens ou crianças, porém, esse tempo é vago e tênue: o neto Zeca, que ouve passivamente a história contada pela avó, ou a neta Fátima que prepara, com doce enlevo e expectativa, o enxoval para o seu casamento.

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Permanência e Impermanência das Coisas em Yasujiro Ozu

21 de julho de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Livros e Filmes | Tags: , ,

Logo após os momentos finais de Tomi, sua mulher, Shukichi (ator Chishu Ryu), não suportando ficar no quarto onde filhos reunidos velam o desenlace da mãe, vai para fora de casa. Para o pequeno espaço contíguo à casa, donde se avista a bela Baía de Seto, colina abaixo. Intimamente, enxergamos mil pensamentos e reminiscências através do seu perfil e dos gestos mansos. A sensação de perda e vazio fugaz, misturada à lembrança recente da viagem um tanto atordoante a Tóquio, da qual ele e a mulher tinham acabado de chegar. Os anos de cumplicidade compartilhados, a paisagem imutável do mar que separa as ilhas de Honshu e Shikoku – que Shukichi tantas vezes contemplara com Tomi (atriz Chieko Higashiyama).

Os barcos a vapor continuam a deslizar levando e trazendo entes queridos que vão e vêm. O mar, as miríades de ilhas e ilhotas lá estão, como sempre estiveram. O som tão familiar do apito dos barcos, porém, agora soa angustiante e intolerável. Pelo rosto de Shukichi alternam-se sentimentos de aturdimento, melancolia, solidão: hakanai, munashii, aware-nai, simplesmente intraduzíveis. O vazio provocado pela sensação de atroz fugacidade, aquela vontade de “ser levado junto”.

Ozu foi mestre em captar tais momentos. Para ele, “atuar é não expressar as coisas, deixar coisas serem ponderadas, saboreadas. Aqueles que apreciam isso alcançam um estado transcendente”. Ele teve a sorte de encontrar atores como Chishu Ryu e Setsuko Hara, que apenas pelas nuances expressivas de seus rostos, olhar e corpos conseguiam exprimir alegria, dor, tristeza, solidão. Nas palavras de Ozu, “Setsuko Hara é uma pessoa admirável. Se houvesse apenas mais quatro ou cinco pessoas como ela…”

Chishu Ryu e Setsuko Hara

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