Tentando aproximar a Ásia da América do Sul e vice-versa

Variações em Torno do Tema da Busca da Felicidade

14 de outubro de 2011
Por: Naomi Doy | Seção: Depoimentos, webtown | Tags: ,

“Fuyu wa mata natsu ga mashi-ja to i-i nikeri”.

(Inverno chega, nos queixamos como era melhor no verão)

– Uejima Onitsura, 1661 / 1738, poeta haikaista.

No verão do racionamento de energia, sob calor recorde de quase 40ºC em certos dias e regiões, japoneses se queixaram muito. Pois com amenas temperaturas de outono, a felicidade já mora no coração de todos. Ahn, sim? Quando despontarem manhãs cinzentas de nevasca e gelo escorregadiço, lamentos ouvir-se-ão, “Ahh, como éramos felizes no verão do super cool biz!”

A tendência do ser humano é sempre achar que a gente era feliz e não sabia. É um querer perpétuo que nunca parece ser satisfeito. Um dito popular já dizia, “a felicidade está onde a pomos, mas nunca a pomos onde estamos”. Que, aliás, foi título de redação em vestibular para Letras em priscas eras antes da FUVEST, quando Filosofia era disciplina no colegial; então, até citei Nietzsche e Zaratustra, e acho que me saí bem. Pois desde poetas e prosadores da antiguidade aos pós-modernos atuais, e a filósofos de todas as épocas e correntes, muito se dissertou sobre a natureza do ser ou não estar feliz, e sobre a busca ou o não encontro da felicidade. E assim falava Zaratustra.

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koufuku – kanji (ideogramas: kôfuku = felicidade

Próceres da democracia sempre se preocuparam em proporcionar esse bem-estar a todos os cidadãos: “… todos os homens foram criados iguais e têm direitos inalienáveis…. à vida, à liberdade e à busca da felicidade.” Muitos atribuem estas linhas à Constituição Americana, mas na verdade estão na Declaração da Independência dos EUA. Redigidas em junho de 1776 e imbuídas de profunda ética de cunho cristão, definem o bem-estar e prosperidade conquistados pelo suor e labor saudável de cada individuo, como direitos que cada um pode dispor como quiser. Ao desmoronar de leis feudais e o raiar da democracia pelo mundo, tais ideais foram incorporados a Constituições de muitas nações. Os franceses proclamaram liberdade, igualdade e fraternidade. Ponderaram ser esta última mais racional do que “felicidade”, que, de concepção subjetiva, não condizia com valores republicanos. O Brasil poderá seguir a orientação da ONU, que reconhece a busca da felicidade como objetivo humano fundamental, e estabelece a importância de políticas públicas com essa finalidade: o Estado deve propiciar aos cidadãos direitos sociais que lhe proporcionem bem-estar. A Proposta de Emenda à Constituição / PEC nº 19, apresentada pelo senador Cristovam Buarque, pretende acrescentar a “busca da felicidade” na lista dos direitos sociais previstos no Artigo 6º da Constituição Brasileira. Aprovado pela Comissão da Constituição e Justiça, o texto está pronto para ser votado pelo plenário e seguir para a Câmara.

Agora, se você está com essas premissas todas na cabeça e é atraído para ver um filme por causa: do título simpático; do casal simpático que o produziu e estrelou; ou do tema e cenário simpáticos (busca de crescimento espiritual pelo mágico Caminho de Santiago de Compostela) – aí o seu cérebro vai derreter de desinfelicidade pela “propaganda enganosa” em que você caiu, e vai descobrir que, antes de ver o filme, você era feliz e não sabia. Cinéfilo brasileiro ama prestigiar cinema nacional. Mas a pergunta que ninguém responde: por que certos filmes brasileiros teimam em inserir clichês estereotipados do que de pior existe na cultura tupiniquim? A chanchada debochada, palavrões inseridos à força e fora de contexto, gozações xenofóbicas repisadas, e piadas pseudoeróticas de mau gosto sem fim? Entristecem cinéfilo conectado, ajudam a deseducar mais ainda algum infeliz desavisado, enquanto a plateia debanda.

Ora, se quiser se entupir de silogismos psquicometafísicos, que vá curtir Lars von Trier, dirá o outro. Certo, se nem tanto para Freud-Nietzsche, tanto menos para deboches caricatos. Mas tenho para mim que toda criação artística ou manifestação cultural e humana – sejam filmes ou livros, telas, esculturas, sinfonias, peças de publicidade, vinhos, amizades, amores – precisam fazer-nos sentir que, ao apreciá-los, algo mudou dentro de nós e nos tornou melhores e mais inspirados depois de os termos apreciado. Isso é felicidade.



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