Tentando aproximar a Ásia da América do Sul e vice-versa

As Mulheres de Yasujiro Ozu

17 de julho de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Livros e Filmes | Tags: , , , , , | 2 Comentários »

Das poucas coisas que se sabe da discreta vida privada de Yasujiro Ozu é que ele nunca se casou, e viveu toda sua vida junto à mãe viúva. Ozu faleceu em 1963, aos 60 anos, no ano seguinte à morte da mãe aos 86 anos. Certamente deve ter sido filho dedicado, a exemplo de muitas filhas de ficção de seus filmes, que não se casavam porque relutavam em deixar sozinhos pai ou mãe, viúvos. Que Ozu entendia de psicologia feminina a fundo, porém, disso não deixou dúvidas. Feminista, ele viveu cercado de mulheres as mais diversas, reais ou de ficção. E que mulheres!

Nos filmes de Ozu não existe mulher fraca de raciocínio ou de caráter. Elas são estóicas, determinadas, práticas. A começar pela jovem Chieko (Junko Matsui), na comédia non sense romântica Dias de Juventude – 1929, filme mudo. Ingênua, indefesa, estudante morando sozinha na cidade grande, porém coquete e esperta. Desperta paixão em dois colegas da turma, um estudioso, outro simpático; mas escolhe ficar com um terceiro, melhor esquiador e melhor partido.

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Chieko Higashiyama e Setsuko Hara:mulheres nos filmes de Yasujiro Ozu.

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Família e Tradição em Yasujiro Ozu

14 de julho de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Livros e Filmes | Tags: , , , , ,

Yasujiro Ozu O Centro Cultural Banco do Brasil, com apoio da Fundação Japão em São Paulo, apresenta, até o dia 25 de julho, a mostra “Emoção e poesia: o cinema de Yasujiro Ozu”. Oportunidade única para a geração cinéfila atual conhecer um dos mais importantes e profícuos cineastas japoneses. E, para os fãs saudosistas de Ozu, rever alguns dos filmes que marcaram os anos 50 – 60, e conhecer outros que permaneciam inéditos no Brasil.

Muito se tem escrito sobre Ozu mundo afora, rotulado com a pecha de o “mais japonês dos cineastas japoneses”. Na verdade, seus filmes apresentam nada mais do que a descrição simples e espontânea da família japonesa e as mudanças que essa unidade familiar experimenta ao longo dos cruciais anos pré e pós II Guerra. Através de relatos do cotidiano rotineiro de famílias da classe média, Ozu vai desfilando as diferenças entre gerações, provocadas pela pressão de mudanças sociais, políticas e econômicas. Essas mudanças são aceleradas com o fim da Guerra e a entrada do Japão na era do desenvolvimento industrial. A procura das cidades grandes é cada vez maior pelos jovens em busca de estudos e para ser “alguém importante na vida”.

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Brumas de Chongqing

10 de julho de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Depoimentos | Tags: , , , ,

Distante 2.400 km de Xangai, rio acima, localizada na península formada pela confluência do intrépido rio Jialin com o poderoso Yangtsé, a cidade de Chongqing marca a passagem do Leste para o Oeste, no coração do continente chinês. Sua posição estratégica, às margens do grande rio e entre as províncias de Sichuan e de Hubei, a fez importante porto fluvial desde tempos imemoriais, escoadouro dos produtos da fértil região, celeiro da China. Durante a II Guerra, foi lá que o governo nacionalista de Chiang Kai-shek buscou abrigar-se dos bombardeios japoneses. Universidades e indústrias do leste também foram transferidas então para Chongqing. Em 1949, com a proclamação da República Popular da China, os nacionalistas se retiraram para Taiwan. O governo de Mao Tsé-tung continuou, porém, a incentivar indústrias a se instalarem em Chongqing, num grande movimento de marcha para o Oeste.

A construção e a recente finalização da usina das Três Gargantas, aliada à complementação de barragens e de projetos de irrigação, tornaram o rio Yangtsé seguramente mais navegável e regularizado contra os problemas de enchentes e inundações. Navios de razoável calado vão e vêm entre Chongqing e o Delta, no Mar Oriental da China, trazendo e escoando produtos. Para melhor coordenar os projetos da Usina, a cidade tinha sido elevada à categoria de Municipalidade Autônoma, em 1997. Chongqing se tornou, desde então, o maior município do mundo, ocupando todo o Leste da província de Sichuan, com 32 milhões de habitantes em todo o seu entorno (os outros municípios autônomos são Beijing, Tianjin e Xangai).

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Vista aérea do Centro de Chingqing – Foto: Galeria de lalatinlala

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Jabulanis e Outras Bolas

1 de julho de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Depoimentos | Tags: , ,

1950. Para os fanáticos do pé-de-bola, ano fatal. Naqueles tempos, bola de futebol para peladas ainda era feita de couro legítimo, com uma câmara-de-ar de borracha, interna, e tinha uma válvula. Como um pneu. De tempos em tempos, era preciso enchê-la de ar com uma bombinha. A câmara-de-ar podia ser trocada quando ficava gasta e frouxa ou se, por algum acidente, furasse. A bola de couro tinha uma abertura com ilhoses e fivela, como num tênis, para retirar e colocar a câmara, popularmente chamada de bexiga. Os gomos de couro vinham costurados com fios grossos, aparentes.

Era uma bola pesada e macia ao mesmo tempo, e não machucava o pé. Mesmo depois de muito usada, conservava o cheiro de couro. Ficava cinzenta quando a pintura branca ia se desgastando. Para conservá-la, os meninos derretiam sebo de boi e hidratavam os gomos com um pano, cuidadosa e pacientemente. Pois bolas de futebol eram muito caras então, de couro legítimo, feitas quase artesanalmente. Para garotos em geral, tratava-se de objeto de desejo raramente conquistado. Às meninas, só nos era permitido observar de longe, sem tocar, que dava azar.

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Beijing – Capital do Norte

23 de junho de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Depoimentos | Tags: , , , ,

Sucessivamente, capitais das antigas dinastias chinesas, as cidades de Xian, Luoyang, Kaifeng, Hangzhou e Nanking seriam finalmente substituídas por Da Du ou Yen Tu, posteriormente denominada Pequim, atual Beijing. Kublai Khan, neto de Genghis Khan, ao fundar a dinastia Yuan de etnia mongol, unificou o vasto império chinês e manteve duas capitais: Yen Tu ou Pequim, ao Norte da China, e Shang Tu ou Xanadu, na Mongólia, fortalecendo o seu poder (1279 – 1368).

No fim do século XIV, ao já enfraquecido império mongol Yuan, sucedeu a dinastia Ming (1368 – 1644), que teve seus primeiros tempos de reinado estabelecido em Nanking (Nanjing). Em 1421, o terceiro imperador Ming, Yongle, mudaria definitivamente a capital para Pequim. Para isso construíra a cidade imperial baseada nos padrões de planejamento urbano chinês tradicional: no centro, o imenso complexo palaciano da Cidade Proibida – assim chamada por ser interditada aos mortais comuns. Rodeada por grandes parques abertos e por hutongs, estreitos e sinuosas ruelas entremeadas de palacetes residenciais com pátios internos. A cidade foi cortada por amplas avenidas e foi toda murada, oferecendo cerco e proteção. Para melhor salvaguardar Pequim, a Grande Muralha foi reforçada e ampliada, e recoberta de tijolos.

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Centro financeiro de Pequim

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Imigração Japonesa no Brasil e Medicina Preventiva

16 de junho de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Depoimentos | Tags: , , , , | 3 Comentários »

Assinados os acordos do Tratado de Amizade e Comércio Brasil-Japão (1895), os entendimentos levariam a uma relação de profícuo intercâmbio entre os dois países e culminaram com o início da imigração japonesa no Brasil (1908). Uma vez concretizada a chegada dos imigrantes, além dos muitos problemas concernentes, o que mais preocupava líderes japoneses era a quase inexistência de assistência médica aos imigrantes tanto na Capital como no Interior. Muitos imigrantes morriam à mercê da falta de assistência médica, de orientação sanitária, por ignorância mesmo. Epidemias de malária, tracoma, leishmaniose (úlcera de Bauru) e ancilostomíase (amarelão) grassavam pelo Interior.

Em 9 de outubro de 1926, num pequeno prédio da Avenida Liberdade, 66, na cidade de São Paulo, um grupo de japoneses imbuídos de um mesmo sentimento de solidariedade, preocupados com os destinos desses imigrantes, reuniu-se para fundar uma associação de amparo fraterno. A Dojinkai – Sociedade Japonesa de Beneficência do Brasil, com estatutos e regulamentos devidamente registrados. A primeira Diretoria eleita nessa Assembleia teve como diretor-presidente o Sr.Yonosuke Yamada, e diretor-gerente o Dr.Sentaro Takaoka. O então embaixador do Japão no Brasil, Sr.Akira Arioshi, logo se tornaria sócio.

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Doutores Sentaro Takaoka e Shizuo Hosoe

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De Comidas, Sabores e Odores

11 de junho de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Depoimentos | Tags: , , , , | 2 Comentários »

“Por que tem gente que odeia tanto o coentro?” pergunta Harold McGee, do New York Times, suplemento da Folha de S.Paulo, 17/05/2010. “Por que tanta gente ama o coentro?” replicaríamos nós.

Hoje em dia, o coentro é erva fina da culinária do Nordeste brasileiro, da Ásia, de Portugal, da Espanha, do Peru e alhures. Estudos indicam que predisposição genética pode explicar a rejeição. Ou, simplesmente, talvez seja falta de aventura e boa vontade que nos faz rejeitar de cara certos sabores e odores de comidas que não nos são familiares.

Na verdade, diz-se que o coentro lembra o sabor de sabão para algumas pessoas (que já lamberam sabão?). Para outras, suscita o aroma de roupa de cama infestada de… percevejos. Não sem razão. Segundo Harold McGee, quimicamente, o coentro é composto de fragmentos de moléculas chamados aldeídos, do mesmo tipo dos encontrados em sabões e loções, e em insetos da família de percevejos. Argh!!

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Ceviche de corvina e coentro in natura

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Sonhos e Nostalgias Com Xangai

7 de junho de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Depoimentos | Tags: , , , ,

Anos 1960-1976: sob a doutrina do Pensamento de Mao, Xangai, como outras metrópoles chinesas, teve grande parte da sua população desalojada e enviada para zonas rurais do vasto interior chinês, para aprender com os camponeses. Famílias estabelecidas tiveram suas propriedades confiscadas nas cidades, como relatam as escritoras Xinran e Jung Chang. Outras foram para os campos por livre e espontânea vontade. Perseguindo o ideal marxista/maoísta, os chineses abraçaram a causa comunista experimentado os valores da vida comunitária rural, de igualdade e justiça social. Jovens mães deixaram filhos aos cuidados do Estado ou dos avós. Como no caso das mães das duas escritoras.

O rápido desenvolvimento industrial e a ascensão econômica global da China a partir de 1980 trariam de volta o êxodo dos campos para as cidades. Xangai, então hub da região que mais crescia, no delta do poderoso Yangtsé, era a que mais seduzia jovens em busca de oportunidades.

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Vista parcial de Xangai à noite e cartaz de divulgação do filme Shanghai Dreams

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Nanjing, Capital do Sul

27 de maio de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Depoimentos | Tags: , , ,

Encruzilhada para aventureiros e descobridores, poetas e artistas, imperadores e revolucionários, Nanjing foi desde sempre o berço da cultura chinesa, aclamada como um das cidades mais bonitas da Terra.

Para o jornalista John Pomfret (Caminhos da China), Nanjing é o lugar “aonde os chineses tradicionalmente iam para lamber suas feridas”, em alusão às muitas vezes em que a cidade acolheu imperadores e súditos fugindo de bárbaros e invasores que saqueavam o Norte do país. Foi assim nos tempos medievais: capital de seis dinastias, quando tribos nômades vindos por trás da Muralha ocuparam o país.

Já no século XIV, Nanjing teve seus tempos áureos quando a Dinastia Ming ali edificou a capital (1368-1421). Hongwu, o primeiro imperador dessa dinastia, ergueu suntuoso palácio protegido por monumentais muralhas. Das muralhas, 70% ainda permanecem. Do palácio, ruínas lembram sua majestade.

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As Filhas Sem Nome, de Xinran, Editora: Companhia das Letras, 2010, tradução da versão inglesa

20 de maio de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Livros e Filmes | Tags: , , , | 2 Comentários »

xinran_filhas Este novo livro da nossa já conhecida Xinran é delicioso. Engajada, sobretudo na luta pela melhoria da condição das mulheres chinesas, ela conta a história real de três jovens entre 16 e 20 anos, transformadas em irmãs para efeito de ficção, que saem do campo para tentar a sorte na cidade grande. Ao narrar a trajetória das moças, Xinran nos leva simultaneamente numa saborosa viagem através dos gostos e cheiros da rica comida de rua de Nanjing, e da sutil culinária Huaiyang e Suzhen do centro-sudeste da China.

A história se passa entre 2001 e 2004, bem recente portanto. Há alguns paradoxos na ficção, como o fato de as meninas originarem de uma mesma família de seis filhas na China, onde a política do filho único era, e ainda é, rigorosamente policiada, mas pouco efetiva no meio rural. A família delas teria, entre os parentes, dois funcionários chefes da Brigada de Produção, encarregada da política de controle de natalidade. O que a pouparia da fiscalização severa e de multas. Intriga também o fato de que elas venham de zonas rurais a apenas três horas de ônibus de Nanjing, Capital da rica Província de Jiangsu, no megapólo industrial e comercial do delta do Rio Yangtsé. E ainda assim, elas serem de uma ingenuidade, inocência e ignorância inacreditáveis. Como se tivessem saído de um dos romances chineses da escritora norte-americana Pearl S. Buck (A Boa Terra, Peônia), populares nos anos 1940-50.

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